8 déc. 2009

23 nov. 2009

Lucrecia Martel no Rio de Janeiro







13 nov. 2009

Lautreamont

Canto Segundo

Raça estúpida e idiota! Hás-de arrepender-te de te portares assim. Sou eu que to digo. Hás-de arrepender-te, olá, hás-de arrepender-te. A minha poesia não consistirá senão em atacar por todos os meios o animal feroz que é o homem, e o Criador, que nunca deveria ter engendrado semelhante escória. Os livros hão-de amontoar-se uns sobre os outros até ao fim da minha vida, e no entanto só encontrarão neles esta idéia, sempre presente à minha consciência!

4 nov. 2009

Canções de mim mesmo.

Eu celebro a mim mesmo,
E o que eu assumo você vai assumir,
Pois cada átomo que pertence a mim pertence a
[você.

Vadio e convido minha alma,
Me deito e vadio à vontade …. observando uma
[lâmina de grama do verão.

Casas e quartos se enchem de perfumes …. as
[estantes estão entulhadas de perfumes,
Respiro o aroma eu mesmo, e gosto e o
[reconheço,
Sua destilação poderia me intoxicar também,
[mas não deixo.

A atmosfera não é nenhum perfume …. não tem
[gosto de destilação …. é inodoro,
É pra minha boca apenas e pra sempre …. estou
[apaixonado por ela,
Vou até a margem junto à mata sem disfarces e
[pelado,
Louco pra que ela faça contato comigo.

A fumaça de minha própria respiração,
Ecos, ondulações, zunzuns e sussurros …. raiz
[de amaranto, fio de seda, forquilha e videira,
Minha respiração minha inspiração …. a batida
[do meu coração …. passagem de sangue e
[ar por meus pulmões,
O aroma das folhas verdes e das folhas secas,
[da praia e das rochas marinhas de cores
[escuras, e do feno na tulha,
O som das palavras bafejadas por minha voz ….
[palavras disparadas nos redemoinhos do
[vento,
Uns beijos de leve …. alguns agarros …. o
[afago dos braços,
Jogo de luz e sombra nas árvores enquanto
[oscilam seus galhos sutis,
Delícia de estar só ou no agito das ruas, ou pelos
[campos e encostas de colina,
Sensação de bem-estar …. apito do meio-dia
[… a canção de mim mesmo se erguendo
[da cama e cruzando com o sol.

Walt Whitman

3 nov. 2009

2 nov. 2009

26 oct. 2009



22 oct. 2009

20 oct. 2009

ESTE É O PRÓLOGO

Deixaria neste livro toda a minha alma. este livro que viu as paisagens comigo e viveu horas santas.
Que pena dos livros que nos enchem as mãos de rosas e de estrelas e lentamente passam !
Que tristeza tão funda é olhar os retábulos de dores e de penas que um coração levanta !
Ver passar os espectros de vida que se apagam, ver o homem desnudo em Pégaso sem asas,
ver a vida e a morte, a síntese do mundo, que em espaços profundos se olham e se abraçam.
Um livro de poesias é o outono morto: os versos são as folhas negras em terras brancas,
e a voz que os lê é o sopro do vento que lhes incute nos peitos - entranháveis distâncias.
O poeta é uma árvore com frutos de tristeza e com folhas murchas de chorar o que ama.
O poeta é o médium da Natureza que explica sua grandeza por meio de palavras.
O poeta compreende todo o incompreensível e as coisas que se odeiam, ele, amigas as chamas.
Sabe que as veredas são todas impossíveis, e por isso de noite vai por elas com calma.
Nos livros de versos, entre rosas de sangue, vão passando as tristes e eternas caravanas
que fizeram ao poeta quando chora nas tardes, rodeado e cingido por seus próprios fantasmas.
Poesia é amargura, mel celeste que emana de um favo invisível que as almas fabricam.
Poesia é o impossível feito possível. Harpa que tem em vez de cordas corações e chamas.
Poesia é a vida que cruzamos com ânsia, esperando o que leva sem rumo a nossa barca.
Livros doces de versos sãos os astros que passam pelo silêncio mudo para o reino do Nada, escrevendo no céu suas estrofes de prata.
Oh ! que penas tão fundas e nunca remediadas, as vozes dolorosas que os poetas cantam !
Deixaria neste livro toda a minha alma...

12 oct. 2009

10 oct. 2009



29 sept. 2009

PATRULHA

As pedras inimizam
Janela arreganha traição
Ramos estrangulam
Montanhas de arbustos folheiam rápido
Berram
Morte.

24 sept. 2009

levou trabalho consigo...
ah renego de quem diz que o nosso amor se acabou ele agora esta mais firme do que quando começou;;;;;;;;;;;;;;;
levou trabalho consigo...
ah renego de quem diz que o nosso amor se acabou ele agora esta mais firme do que quando começou;;;;;;;;;;;;;;;

26 juil. 2009

old man

Velho, olhe para a minha vida
Vinte e quatro anos e ainda há muito mais
Vivo sozinho num paraíso
Que me faz pensar em dois

22 juil. 2009

Amanhecer distante...

10 juil. 2009

ACERCA DA OBRA DE BURROUGHS

A receita será esta: carne da mais pura,
sem qualquer molho simbólico;
visões reais & prisões reais
tal como os vemos uma vez por outra.

Prisões e visões apresentadas
com rarissímas descrições
que correspondam exactamente
às de Alcatraz e de Rose.

Um almoço nu é para nós o normal;
comemos sanduíches da realidade.
Ao passo que as alegorias não passam de folhas de alface.

Não escondamos sob elas a loucura.

23 juin 2009

I Do Not Know What It Is I Am Like Cinemagrotesque.


A mosca que pousou no prato do Bill Viola.

17 juin 2009

Dinheiro


O dinheiro é a coisa mais importante do mundo. Representa: saúde, força, honra, generosidade e beleza, do mesmo modo que a falta dele representa: doença, fraqueza, desgraça, maldade e fealdade.

12 juin 2009

A contestação não é o esforço do pensamento para negar existências
ou valores, é o gesto que reconduz cada um deles aos seus limites, e
por aí ao Limite no qual se cumpre a decisão ontológica: contestar é ir
até o núcleo vazio no qual o ser atinge seu limite e no qual o limite
define o ser.

8 juin 2009

Quanta Tristeza e Amargura

Quanta tristeza e amargura afoga
Em confusão a 'streita vida!
Quanto Infortúnio mesquinho
Nos oprime supremo!
Feliz ou o bruto que nos verdes campos
Pasce, para si mesmo anônimo, e entra
Na morte como em casa;
Ou o sábio que, perdido
Na ciência, a fútil vida austera eleva
Além da nossa, como o fumo que ergue
Braços que se desfazem
A um céu inexistente.

Douglas diz:
Ricardo Reis, in "Odes"
Heterónimo de Fernando Pessoa

2 juin 2009

O Poeta Morre



O Poeta morre, mas não cessa de escrever. Enquanto escreve, vive ressuscitando fugidias horas mudadas em auroras... Uma pequenina flor, pisada por quem passa, é agora um milagre de cor, uma negaça de mil desejos... E os beijos que nunca foram dados, tornados tão reais... Aquela borboleta arrasta infindas primaveras no seu voo fremente... - Uma palavra mais, Poeta! Uma palavra quente! Uma palavra para todo o sempre!

27 mai 2009

Robert Bresson (FRAGMENTOS)

Me livrar dos erros e falsidades acumulados. Conhecer meus meios, garantir-me deles.
*
A faculdade de bem me servir de meus meios diminui quando o número deles aumenta.
*
Controlar a precisão. Ser eu mesmo um instrumento de precisão
*
Não ter a alma de um executante. Encontrar, para cada pano, um novo sal em relação ao que eu tinha imaginado. Invenção (reinvenção) imediata.
*
Metteur-en-scène [encenador] ou director. Não se trata de dirigir alguém, mas de se dirigir a si mesmo.
*
Não atores.
(Não direção de atores.)
Não papéis.
(Não estudo de papéis.)
Não direção.
Mas o emprego de modelos, na vida.
SER (modelos) ao invés de PARECER (atores).

MODELOS:
Movimento do fora para o dentro. (Atores: movimento de dentro para fora.)
O importante não é o que eles me mostram, mas o que eles me escondem, e sobretudo aquilo que eles não suspeitam que está neles.
Entre eles e mim: trocas telepáticas, adivinhação.
*
(1925?) O CINEMA SONORO abre as portas ao teatro, que ocupa o lugar e o envolve com arame farpado.
*
Dois tipos de filmes: aqueles que empregam os meios do teatro (atores, encenação, etc.) e se servem da câmera a fim de reproduzir; aqueles que empregam os meios do cinematógrafo e se servem da câmera a fim de criar.
*
O terrível hábito do teatro.
*
O CINEMATÓGRAFO É UMA ESCRITA COM IMAGENS EM MOVIMENTO E SONS.
*
Um filme não pode ser um espetáculo, porque um espetáculo exige a presença em carne e osso. No entanto ele pode, como no teatro fotografado ou CINEMA, ser a reprodução fotográfica de um espetáculo. Ora, a reprodução fotográfica de um espetáculo é comparável à reprodução fotográfica de uma tela de pintor ou de uma escultura. Mas a reprodução fotográfica de SÃO JOÃO BATISTA de Donatello ou a MOÇA COM O COLAR de Vermeer não tem nem o poder, nem o valor, nem o preço dessa escultura ou dessa tela. Ela não cria. Ela não cria nada.
*
Os filmes de CINEMA são documentos de historiador a serem colocados em arquivos: como se atuava em 19.., Sr. X, Sra. Y.
*
Um ator está no cinematógrafo como num país estrangeiro. Ele não fala a língua corrente.
*
O teatro fotografado ou CINEMA quer que um encenador ou director faça os atores interpretarem a comédia e fotografa esses atores atuando; em seguida ele alinha as imagens. Teatro bastardo ao qual falta o que faz o teatro: presença material dos atores vivos, ação direta do público sobre os atores.
*
Sem perder a naturalidade, perdem a natureza
Chateaubriand.
Natureza: o que a arte dramática suprime em proveito de um natural apreendido e desenvolvido por exercícios.
*
Nada é mais falso num filme do que o tom natural do teatro recopiando a vida e calcado em sentimentos estudados.
*
Achar mais natural que um gesto seja feito, que uma frase seja dita assim ao invés de assado é absurdo, não tem sentido no cinematógrafo.
*
Não há relações possíveis entre um ator e uma árvore. Eles pertencem a dois universos diferentes. (Uma árvore de teatro simula uma árvore verdadeira.)
*
Respeitar a natureza do homem sem querer que ela seja mais palpável do que é.
*
Não existe casamento do teatro com o cinema sem extermínio dos dois.
*
Filme de cinematógrafo em que a expressão é obtida por relações de imagens e de sons, e não por uma mímica, gestos e intonações de voz (de atores ou não-atores). Que não analisa nem explica. Que recompõe.
*
É preciso que uma imagem se transforme em contato de outras imagens como uma cor em contato com outras cores. Um azul não é o mesmo azul ao lado de um verde, de um amarelo, de um vermelho. Não existe arte sem transformação.
*
O verdadeiro do cinematógrafo não pode ser o verdadeiro do teatro, nem o verdadeiro do romance, nem o verdadeiro da pintura. (O que o cinematógrafo captura com seus meios próprios não pode ser o que o teatro, o romance, a pintura capturam com seus meios próprios.)
*
Filme de cinematógrafo em que as imagens, como as palavras do dicionário, não têm poder e valor a não ser por sua posição e relação.
*
Se uma imagem, observada à parte, exprime nitidamente alguma coisa, se ela comporta uma interpretação, ela não se transformará ao contato de outras imagens. As outras imagens não terão nenhum poder sobre ela, e ela não terá nenhum poder sobre as outras imagens. Nem ação, nem reação. Ela é definitiva e inutilizável no sistema do cinematógrafo. (Um sistema não regula tudo. Ele é uma isca para qualquer coisa.)
*
Aplicar-me a imagens insignificantes (não significantes).
*
Achatar minhas imagens (como com um ferro de passar), sem atenuá-las.
*
Da escolha dos modelos.
Sua voz me desenha sua boca, seus olhos, sua figura, me faz seu retrato inteiro, exterior e interior, melhor do que se estivesse diante de mim. A melhor decifração obtida só pela orelha.

DOS OLHARES
De quê? : “Um único olhar desencadeia uma paixão, um assassinato, uma guerra.”
*
A força ejaculadora do olho.
*
Montar um filme é ligar os personagens uns aos outros e aos objetos pelos olhares.
*
Duas pessoas que se observam nos olhos não vêem seus olhos mas seus olhares. (Razão pela qual as pessoas se enganam sobre a cor dos olhos?)
*
De duas mortes e três nascimentos.
Meu filme nasce uma primeira vez na minha cabeça, morre no papel; é ressuscitado pelas pessoas vivas e os objetos reais que eu emprego, que são mortos na película mas que, colocados numa certa ordem e projetados numa tela, se reanimam como flores n’água1.
*
Admitir que X seja alternadamente Átila, Maomé, um empregado de banco, um lenhador, é admitir que X atua. Admitir que X atua, é admitir que os filmes em que X atua derivam do teatro. Não admitir que X atue, é admitir que Átila = Maomé = empregado de banco = lenhador seja absurdo.
*
Aplausos durante o filme de X. A impressão “teatro” irresistível.
*
Modelo. Fechado em sua misteriosa aparência. Ele trouxe consigo tudo aquilo que, nele, estava fora. Ele está aqui, atrás dessa frente, essas faces.
*
“Dialeto visível” dos corpos, dos objetos, das casas, das ruas, das árvores, dos campos.
*
Criar não é deformar ou inventar pessoas e coisas. É travar entre pessoas e coisas que existem e tais como existem, relações novas.
*
Suprima radicalmente as intenções nos modelos.
*
Aos teus modelos: “Não pensem o que estão dizendo, não pensem o que estão fazendo.” E também: “Não pensem no que estão dizendo, não pensem no que estão fazendo”.
*
Tua imaginação visará menos os acontecimentos do que os sentimentos, ao mesmo tempo querendo que esses últimos sejam o mais documentais possível.
*
Tu conduzirás teus modelos a tuas regras, eles te deixando agir sobre eles, e tu deixando-os agir sobre ti.
*
Um só mistério das pessoas e dos objetos.
*
Quando um violino basta, não empregar dois2.
*
O verdadeiro se reconhece por sua eficácia, por sua potência.
*
Apaixonado pela justeza.
*
Rosto expressivo do ator em que a menor dobra comandada por ele, aumentada na lupa, evoca os excessos do kabuki.
*
Opor ao relevo do teatro o liso do cinematógrafo.
*
Quanto maior é o êxito, mais ele beira o revés (como uma obra-prima de pintura beira o cromo).
*
O que se passa nas juntas. “As grandes batalhas, dizia o general de M..., se dão quase sempre nos pontos de interseção dos mapas do estado-maior.”
*
Cinematógrafo, arte militar. Preparar um filme como uma batalha3.
*
Um conjunto de imagens boas pode ser detestável.

DO VERDADEIRO E DO FALSO
A mistura do verdadeiro e do falso dá o falso (teatro fotografado ou cinema). O Falso quando é homogêneo pode dar o verdadeiro (teatro).
*
Na mistura do verdadeiro e do falso, o verdadeiro deve soltar-se do falso, o falso impede de crer no verdadeiro. Um ator simulando medo de naufrágio na prancha de um verdadeiro navio revirado por uma tempestade verdadeira, nós não acreditamos nem no ator, nem no navio, nem na tempestade.

DA MÚSICA
Nada de música de acompanhamento, de sustentação ou de reforço. Música de forma alguma4.
É preciso que os barulhos se tornem música.
*
Filmagem. Nada de inesperado que não seja secretamente esperado por ti.
*
Aprofunde-se sem sair do lugar. Não deslize para fora. Duplo, triplo fundo das coisas.
*
Certifique-se de ter esgotado tudo o que se comunica pela imobilidade e pelo silêncio.
*
Tire de teus modelos a prova de que eles existem com suas bizarrices e seus enigmas.
*
Tu chamarás um filme de belo quando ele te der uma alta idéia do cinematógrafo.
*
Não há valor absoluto de uma imagem.
Imagens e sons não deverão seu valor e seu poder senão ao emprego ao qual tu os destina.
*
Modelo. Questionado (pelos gestos que tu o conduzes a fazer, as palavras que tu o fazes dizer). Resposta (quando seria apenas uma recusa em responder) que muitas vezes tu não percebes mas que tua câmera registra. Submetido em seguida a teu estudo.

DO AUTOMATISMO
9/10 de nossos movimentos obedecem ao hábito e ao automatismo. É anti-natureza subordiná-los à vontade e ao pensamento.
*
Modelos tornados automáticos (tudo pesado, medido, cronometrado, ensaiado dez, vinte vezes) e deixados no meio dos acontecimentos de teu filme, suas relações com as pessoas e com os objetos em torno deles serão justas, porque elas não serão pensadas.
*
Modelos automaticamente inspirados, inventivos.
*
Teu filme, que dele se sintam a alma e o coração, mas que ele seja feito como um trabalho de mãos.
*
O CINEMA bebe num fundo comum. O cinematógrafo faz uma viagem de descoberta num planeta desconhecido.
*
Onde não há tudo, mas onde cada palavra, cada olhar, cada gesto tenham segredos.
*
Significativo que o filme de X, filmado na beira da praia, respire o odor característico do tablado.
*
Filmar no improviso, com modelos desconhecidos, em lugares imprevistos próprios a me manter num estado atento de alerta.
*
Que seja a união íntima das imagens que as carregue de emoção.
*
Agarrar instantes. Espontaneidade, frescor.
*
Como dissimular que tudo acaba num retângulo de tela branca suspenso num muro? (Veja teu filme como uma superfície a cobrir.)
*
X imita Napoleão, cuja natureza era não imitar.
*
Em ***, filme que deriva do teatro, esse grande ator inglês balbucia, para nós fazer crer que ele inventa continuamente as frases que ele deve dizer. Seus esforços para se tornar mais vivo fazem o exato contrário.
*
Uma imagem muito esperada (clichê) jamais parecerá justa, mesmo que ela o seja.
*
Monte teu filme à medida que tu filmas. Ele se forma de nós (de força, de segurança) aos quais se prende todo o resto.
*
O que nenhum olho humano é capaz de agarrar, nenhum giz, pincel, pluma de fixar, tua câmera agarra sem saber o que é e a fixa com a indiferença escrupulosa de uma máquina.
*
Imobilidade do filme de X cuja câmera corre, voa.
*
Um suspiro, um silêncio, uma palavra, uma frase, um alarido, uma mão, teu modelo inteiro, seu rosto, em repouso, em movimento, de perfil, de face, uma visão imensa, um espaço restrito... Cada coisa exatamente em seu lugar: teus únicos meios.
*
Um mar de palavras não estraga um filme. Questão de espécie, não de quantidade.
*
Não seria ridículo dizer a teus modelos: “Eu vos invento como sois”.
*
O laço insensível que liga tuas imagens mais distanciadas e mais diferentes, é tua visão.
*
Não corra atrás da poesia. Ela penetra sozinha pelas juntas (elipses).
*
X, ator, incerto como uma cor incerta feita de dois tons superpostos.
*
No tablado, a atuação se acrescenta à presença real, intensificando-a. Nos filmes, a atuação suprime mesmo o semblante de presença real, mata a ilusão criada pela fotografia.
*
(1954?) Almoço do GRANDE PRÊMIO. Zarolho no reino dos voluntariamente cegos.
Where is my judgement fled
That censures falsely what they see alright.
*
Que sejam os sentimentos a conduzir os acontecimentos. Não o inverso.
*
Cinematógrafo: forma nova de escrever, logo de sentir.
*
Modelo. Dois olhos móveis numa cabeça móvel, ela mesma num corpo móvel.
*
Que teus fundos (bulevares, praças, jardins públicos, metrôs) não absorvam os rostos que tu ali aplicas.
*
Modelo. Tu lhe ditas gestos e palavras. Ele tá dá de volta (tua câmera registra) uma substância.
*
Modelo. Jogado na ação física, sua voz, partindo de sílabas iguais, toma automaticamente as inflexões e as modulações próprias a sua verdadeira natureza.
*
Em toda arte, existe um princípio diabólico que age contra ela e tem a tarefa de demolir. Um princípio análogo talvez não seja completamente desfavorável ao cinematógrafo.
*
Formas que se parecem com idéias. Considerá-las como verdadeiras idéias.
*
Modelo. “Todo face5.”
*
Filmagem.
Maravilhosos acasos aqueles que agem com precisão6. Modo de descartar os maus, aproximar os bons. Reservar a eles de partida um lugar em tua composição.
*
Atores, roupas, cenários e mobiliários de teatro devem fazer pensar antes de tudo ao teatro. Ficar atento para que as pessoas e os objetos de meu filme façam pensar antes de tudo no cinematógrafo.
*
Quem pode com o menos pode com o mais. Quem pode com o mais não necessariamente pode com o menos.
*
Filmagem. Ater-se unicamente a impressões, a sensações. Nenhuma intervenção da inteligência que seja estrangeira a essas impressões e sensações.
*
Poder que têm tuas imagens (achatadas) de serem outras além do que são. A mesma imagem conduzida por dez caminhos diferentes será dez vezes uma imagem diferente.
*
NEM ENCENADOR, NEM CINEASTA. ESQUECE QUE FAZES UM FILME.
*
Ator. “O vai-e-vem do personagem diante de sua natureza” obriga o público a procurar o talento em seu rosto, ao invés do enigma particular a todo ser vivo.
*
Não há mecânica intelectual ou cerebral. Simplesmente uma mecânica.
*
Se, na tela, a mecânica desaparece e se as frases que tu os fizeste dizer, os gestos que tu os fizeste realizar estão no mesmo elemento com teus modelos, com teu filme, contigo, então o milagre se dá.
*
Desequilibrar para reequilibrar.
*
As idéias, escondê-las, mas de maneira que se possa encontrá-las. A mais importante será a mais escondida.
*
Atuação, que parece ter uma existência própria, à parte, fora do ator, ser palpável.
*

DA POBREZA
Carta de Mozart, a propósito de alguns de seus próprios concertos (KV 413, 414, 415): “Eles mantêm a justa medida entre o mais difícil e o mais fácil. Eles são brilhantes..., mas a eles falta pobreza.”
*
Montaigne: Os movimentos da alma nascem com mesmo progresso que os do corpo.
*
Acesso inabitual aos corpos.
À espreita dos movimentos mais insensíveis, mais interiores.
*
Não hábil, mas ágil.
*
Alta súbita de meu filme quando eu improviso, baixa quando eu executo.
*
O CINEMA procura a expressão imediata e definitiva por mímica, gestos, intonações de voz. Esse sistema exclui forçosamente a expressão por contatos e trocas de imagens e de sons e as transformações que daí resultam.
*
Aquilo que passou por uma arte e dela conservou a marca não pode mais entrar numa outra7.
*
Impossibilidade de exprimir fortemente alguma coisa pelos meios conjugados de duas artes. Ou uma, ou outra.
*
Não filmar para ilustrar uma tese, ou para mostrar homens e mulheres presos a seu aspecto exterior, mas para descobrir a matéria da qual eles são feitos. Atingir esse “coração do coração” que não se deixa prender nem pela poesia, nem pela filosofia, nem pela dramaturgia.
*
Imagem e sons como pessoas que se conhecem na estrada e não podem mais se separar.
*
Nada sobrando, nada faltando.
*
Filme de X. Dois olhos malvados, que se esforçam em ser bons; uma boca amarga feita para o silêncio, que não pára de falar e de contradizer sistematicamente as palavras: Star-system em que homens e mulheres têm uma existência de fato (fantasística).
*
Charme do filme de X feito de coisinhas dispersas aqui e acolá.
*
Tal como são concebidos, os filmes de CINEMA só pode utilizar atores, e os filmes de cinematógrafo só modelos.
*
A música ocupa todo o lugar e não dá mais valor à imagem à qual ela se associa.
*
O CINEMA SONORO INVENTOU O SILÊNCIO
*
Silêncio absoluto e silêncio obtido pelo pianissimo dos ruídos.
*
Filme de X. Vociferações, rugidos, como no teatro.
*
Modelo. O que tu revelas de ti por coincidência com ele.
Que cada imagem, cada som se meça não somente a teu filme e a teus modelos, mas a ti.
*
Limpe a atenção do público (como se diz da limpeza de uma chaminé).
*
Um pequeno tema pode dar pretexto a combinações múltiplas e profundas. Evite os temas grandes demais ou por demais distantes, em que nada te adverte quando tu te desgarras. Ou então pega apenas aquilo que poderia ser fundido à tua vida e deriva de tua experiência.
*
Generalidade da música, que não corresponde à generalidade de um filme. Exaltação que impede as outras exaltações.
*
“O diabo lhe saltou na boca”: não fazer saltar o diabo numa boca.
*
“Todos os maridos são feios”: não mostrar uma multidão de maridos feios.
*
Da iluminação.
Coisas tornadas visíveis não por mais luz, mas pelo ângulo novo sob o qual eu os observo.
*
Aproximar as coisas que ainda não foram aproximadas e não pareciam predispostas a sê-lo.
*
Filme de X, aberto de todos os lados. Dispersão.
*
Modelo. Sobre seus traços, pensamentos ou sentimentos não expressos materialmente , tornados visíveis por intercomunicação e interação de dois ou várias outras imagens.
*
Nem inchaço, nem sobrecarga.
*
Debussy tocava com o piano fechado.
*
Uma única palavra, um único gesto não justo ou somente mal colocado impede todo o resto.
*
Valor rítmico de um ruído.
Ruído de porta que se abre e se fecha, ruído de passos, etc., para a necessidade do ritmo.
*
Uma coisa falhada, se tu a mudas de lugar, pode ser uma coisa bem-sucedida.
*
Modelo: sua permanência: maneira sempre igual de ser diferente.
*
Um ator tem necessidade de sair de si mesmo para se ver no outro. TEUS MODELOS, UMA VEZ SAÍDOS DE SI MESMOS, NÃO PODERÃO MAIS ENTRAR.
*
Reorganizar os ruídos não-organizados (o que tu crês ouvir não é o que tu ouves) de uma rua, de uma estação de ferrovia, de um aeródromo... Retomá-los um a um no silêncio e dosar a mistura.
*
Atuação.
O ator: “Não sou eu que vês, que ouvis, é o outro.” Mas não podendo ser inteiramente o outro, ele não é esse outro.
*
Filmes de CINEMA controlados pela inteligência, não indo mais longe que isso.
*
Retoque do real com o real.
*
Modelo. Sua essência pura.
*
As trocas que se dão entre imagens e imagens, sons e sons, imagens e sons dão às pessoas e aos objetos de teu filme sua vida cinematográfica, e, por um fenômeno sutil, unificam tua composição.
*
Imagens condutoras do olhar. MAS A ATUAÇÃO DO ATOR DESVIA O OLHO.
*
Com as Belas Artes nenhuma concorrência.
*
Desmontar e remontar até chegar à intensidade.
*
Não pense em teu filme fora dos meios em que tu te pensas.
*
Um ator vindo do teatro traz forçosamente as convenções, a moral e deveres para com sua arte.
*
Faz-te homogêneo a teus modelos, faz com que eles sejam homogêneos a ti.
*
Imagens em previsão de sua associação interna.
*
Modelos mecanizados exteriormente, livres interiormente. Sobre seus rostos, nada de desejado. “O constante, o eterno sob o acidental.”
*
Seja o primeiro a ver aquilo que tu vês como tu o vês.
*
Barbárie ingênua da dublagem.
Vozes sem realidade, não conformes ao movimento dos lábios. A contra-ritmo dos pulmões e do coração. Que “se enganaram de boca”.
*
Recolocar o passado no presente. Magia do presente.
*
Modelo. Todas as coisas que não pudeste conceber antes, nem mesmo durante.
*
Modelo. Alma, corpo inimitáveis.
*
Uma coisa velha torna-se nova se tu a deslocas daquilo que a rodeia costumeiramente.
*
Todos esses efeitos que tu podes extrair da repetição (de uma imagem, de um som).
*
Encontrar um parentesco entre imagem, som e silêncio. Dar a eles o ar de se agradarem juntos, de ter escolhido seus lugares. Milton: Silence was pleased.
*
Modelo. Reduzir ao mínimo a parte de sua consciência. Restringir a engrenagem na qual ele não pode não ser ele mesmo e não pode fazer nada além de ser útil.
*
Imagens. Como as modulações em música.
*
Modelo. Contraído em si mesmo. Do pouco que ele deixa escapar, só tome aquilo que te convém.
*
Filme de X. Contágio da literatura: descrição por coisas sucessivas (panorâmicas e travellings).
*
Acontece que a desordem de um filme, porque ele é monótono, nos engana, nos dá a ilusão de ordem. Mas é uma ordem negativa, estéril. À DISTÂNCIA RESPEITOSA DA ORDEM E DA DESORDEM.
*
Escava tua sensação. Observa o que há dentro. Não a analisa com palavras. Traduza em imagens irmãs, em sons equivalentes. Quanto mais ela for nítida, mais teu estilo se afirma. (Estilo: tudo que não é a técnica)
*
Filmagem.
Teu filme deve parecer com aquele que tu vês fechando os olhos. (Tu deves ser capaz a todo instante de vê-lo e de ouvi-lo inteiro.).

VISÃO E AUDIÇÃO
Saber exatamente o que esse som (ou essa imagem) vem fazer ali
*
O que é para o olho não deve fazer duplo emprego com o que é para a orelha.
*
Se o olho está inteiramente conquistado, nada ou quase nada dar à orelha8. Não se pode ser ao mesmo tempo todo olhos e todo ouvidos.
*
Quando um som pode substituir uma imagem, suprimir a imagem ou neutralizá-la. A orelha vai mais para dentro, a imagem mais para fora.
*
Um som jamais deve vir socorrer uma imagem, nem uma imagem socorrer um som.
*
Se um som é o complemento obrigatório de uma imagem, dar a preponderância ou ao som, ou à imagem. Em igualdade, eles se prejudicam ou se matam, como se diz das cores.
*
Não é necessário que imagem e som adquiram pulso firme, mas que cada um trabalhe por sua vez com uma espécie de reserva.
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O olho solicitado só torna a orelha impaciente, a orelha solicitada só torna o olho impaciente. Utilizar essas impaciências. Potência do cinematógrafo que se dirige a dois sentidos de forma regulável.
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Às táticas de velocidade, de ruído, opor táticas de lentidão, de silêncio.
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***, filme americano (inglês?) em que as duas estrelas disputam a atenção do público. Ordem que eles impõem a seus traços e não deixam de vigiar. Um lado “museu Grévin” de seus rostos em cor9.
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Modelo. Preservado de toda obrigação para com a arte dramática.
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No tablado, um cavalo ou um cachorro que não é de gesso ou papelão causa um mal-estar. Ao contrário do cinematógrafo, procurar uma verdade no real é funesto ao teatro.
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Modelo. A causa que o faz dizer esta frase, fazer esse gesto não está nele, ela está em ti. As causas não estão nos teus modelos. Nos palcos e nos filmes de CINEMA, o ator deve nos fazer crer que a causa está nele.
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Tudo foge e se dispersa. Continuamente restabelecer tudo a um.
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O campo do cinematógrafo é incomensurável. Ele te dá uma potência ilimitada de criar.
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Modelo. Entre ele e ti, não somente reduzir ou suprimir a distância. Exploração profunda.
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Atores. Quanto mais eles se aproximam (na tela) com sua expressividade, mais eles se distanciam. As casas, as árvores se aproximam: os atores se distanciam.
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Nada de mais deselegante e de mais ineficaz do que uma arte concebida na forma de uma outra.
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Não há nada a esperar de um CINEMA ancorado no teatro.
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Voz natural, voz trabalhada.
A voz: alma feita carne. Trabalhada como em X, ela não é mais nem alma nem carne. Instrumento de precisão, mas instrumento à parte.
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Mudar o tempo todo de objetivas fotográficas é como mudar o tempo todo de óculos.
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Crer.
Teatro e CINEMA: alternância entre crer e não crer. Cinematógrafo: continuamente crer.
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Praticar o preceito de encontrar sem procurar.
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Modelos. Se deixando conduzir não por ti, mas pelas palavras e os gestos que tu os faz dizer e fazer.
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A teus modelos: “Não se deve interpretar nem a um outro nem a si mesmo. Não se deve interpretar ninguém.”
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Coisa exprimível unicamente pelo novo cinematógrafo, então coisa nova.
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Ao mesmo tempo precisão e imprecisão da música. Mil sensações possíveis, imprevisíveis.
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Um ator retira de si aquilo que não é verdadeiramente. Ilusionista.
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Evitar os paroxismos (cólera, terror, etc.) que se é obrigado a simular e em que todo mundo se parece.
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Ritmos.
A toda-potência dos ritmos.
Só é durável o que está tomado em ritmos. Submeter o fundo à forma e os sentidos aos ritmos.


1. Cinematografar alguém não é dotá-lo de vida. É porque eles estão vivos que os atores transformam uma peça de teatro em algo vivo.
2. Ti avverto se in qualche concerto troverai scritto solo dovrà essere suonato da un solo violino (Vivaldi).
3. Em Hedin, nós ficamos instalados no Hotel de France. Durante a noite, me perseguia o dito de Napoleão: “Eu faço meus planos de batalha com o espírito de meus soldados adormecidos”.
4. A não ser, claro, a música tocada por instrumentos visíveis.
5. “Eu não sei quem perguntava a um de nossos mendigos que ele via apenas de camisa em pleno inverno tão exultante como se estivesse enfurnado em peles até as orelhas, como ele podia suportar: “E você, senhor”, respondeu ele, “o senhor tem a face descoberta: ora, eu sou todo face.” (Montaigne, Ensaios, I, capítulo XXXVI.
6. “Eu pinto muitas vezes os buquês do lado em que não os preparei.” (Auguste Renoir a Matisse. Citado de memória).
7. CINEMA e teatro mantêm-se por comodidade. Existe interesse na confusão.
8. E inversamente, se a orelha está inteiramente conquistada, nada dar ao olho.
9. Museu Grévin: museu de figuras de cera fundado em 1882.

25 mai 2009

Fragmento de Uma Vela



"(...)
A lâmpada vela,
e portanto vigia.
Quanto mais estreito é o fio de luz,
mais penetrante é a vigilância.
(...)
A lâmpada é um signo de uma grande espera.
Pela luz da casa distante,
a casa vê,
vela,
vigia,
espera.
(...)
Por sua luz,
a casa é humana.
Ela vê como um homem.
É um olho aberto para a noite.
(...)"

Gaston Bachelard

A Minha Felicidade

Depois de estar cansado de procurar Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente Navego com todos os ventos.

24 mai 2009

BOCA IMORTAL

Abre a boca mordaz num riso convulsivo
Ó fera sensual, luxuriosa fera!
Que essa boca nervosa, em riso de pantera,
Quando ri para mim lembra um capro lascivo.
Teu olhar dá-me febre e dá-me um brusco e vivo
Tremor às carnes, que eu, se ele em mim reverbera,
Fico aceso no horror da paixão que elegera,
Inflamada, fatal, dum sangue rubro e ativo.

Mas a boca produz tais sensações de morte,
O teu riso, afinal, é tão profundo e forte
E tem de tanta dor tantas negras raízes;

Rigolboche do som, ó flor pompadouresca!
Que és para mim, no mundo, a trágica e dantesca
Imperatriz da Dor, entre as imperatrizes!

CRUZ E SOUSA
Londe de tudo
É livres, livres desta vã matéria,
longe, nos claros astros peregrinos
que havemos de encontrar os dons divinos
e a grande paz, a grande paz sidérea.
Cá nesta humana e trágica miséria,
nestes surdos abismos assassinos
teremos de colher de atros destinos
a flor apodrecida e deletéria.
O baixo mundo que troveja e brama
só nos mostra a caveira e só a lama,
ah! só a lama e movimentos lassos...
Mas as almas irmãs, almas perfeitas,
hão de trocar, nas Regiões eleitas,
largos, profundos, imortais abraços.

Cruz e Souza
Pierre Alechinsky, (n. 1927) - (Grupo Cobra)
Karel Appel, (1921-2006) - (Grupo Cobra)
Jean René Bazaine, (1904 - 2001)
Roger Bissière, (1888 - 1964)
Norman Bluhm, (1921-1999)
Camille Bryen, (1902 – 1977)
Alberto Burri, (1915 - 1995)
Jean Dubuffet, (1901 - 1985)
Jean Fautrier, (1898 - 1964)
Sam Francis, (1923 - 1994)
Elaine Hamilton (n. 1920)
Hans Hartung, (1904 - 1989)
Paul Jenkins, (n. 1923)
Asger Jorn, (1914-1973) - (Grupo Cobra)
André Lanskoy, (1902 - 1976)
Georges Mathieu, (n. 1921)
Henri Michaux, (1899 - 1984)
Serge Poliakoff, (1900 - 1969)
Maria Helena Vieira da Silva, (1908 - 1992)
Pierre Soulages, (n. 1919)
Nicolas de Staël, (1914 - 1955)
Michel Tapié, (1909-1987)
Antoni Tàpies, (n. 1923)
Bram van Velde, (1895 - 1981)
Wols (Alfred Otto Wolfgang Schulze), (1913 - 1951)
William Gear, (1915-1997) - (Grupo Cobra)
Zao Wou Ki, (n. 1921)

Fragmentos de um domingo.

E é a força sem fim de duas bocas,
De duas bocas que se juntam, loucas!
De inveja as gaivotas a gritar...

Alexandre O'Neill

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O Deus-Verme
de Augusto dos Anjos

Fator universal do transformismo.
Filho da teleológica matéria,
Na superabundância ou na miséria,
Verme - é o seu nome obscuro de batismo.

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Então, o mais terrível dos males, a morte, não é nada para nós, porque quando estamos vivos é a morte que não está presente; quando a morte está presente, nós não mais estamos. A morte, então, não é nada, nem para os vivos, nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, e estes não mais estão aqui. Contudo, a maioria, no confronto da morte, ora foge dela como se fosse o maior dos males, ora a procura como solução dos males da vida.
(DIÓGENES LAÉRCIO X, Carta a Meneceu, 125-126)

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Manoel de Barros

Há um comportamento de eternidade nos caramujos.
Para subir os barrancos de um rio, eles percorrem um dia inteiro até chegar amanhã.
O próprio anoitecer faz parte de haver beleza nos caramujos.
Eles carregam com paciência o início do mundo.
No geral os caramujos têm uma voz desconformada por dentro.
Talvez porque tenham a boca trôpega.
Suas verdades podem não ser.
Desde quando a infância nos praticava na beira do rio
Nunca mais deixei de saber que esses pequenos moluscos
Ajudam as árvores a crescer.
E achei que esta história só caberia no impossível.
Mas não; ela cabe aqui também.

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Dialética
Vinícius de Moraes

É claro que a vida é bela
E a alegria, a única indizível emoção
É claro que te acho linda
Em ti bendigo o amor das coisas simples
É claro que te amo
E que tenho tudo pra ser feliz

Mas acontece que eu sou triste...

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Pré-História
de Murilo Mendes

Mamãe vestida de rendas
Tocava piano no caos.
(...)

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Um dia desses, quero ser um grande poeta inglês do século passado,
Dizer:
Oh céu, oh mar, oh clã, oh destino
Lutar na Índia em 1866
E sumir num naufrágio clandestino

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Gota a gota tomba o silêncio. Condensa-se no telhado da mente e cai por tanques de água abaixo. Para sempre sozinho, sozinho, sozinho – ouço o silêncio tombar e espalhar seus círculos até os mais longínquos recantos. Saciado e repleto, sólido na satisfação da meia-noite, eu, a quem a solidão destrói, deixo que o silêncio tombe gota a gota.

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Não basta que as ruinas do deserto ainda cheirem a home; que um sôpro menstrual corra sôbre elas nos turbilhões masculinos do ceu; não basta que o combate eterno do homem e da mulher atravesse os canais ravinados de pedra, as colunas super-aquecidas do ar.

Antonin Artaud
Heliogabalo ou o Anarquista Coroado

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Manoel de Barros
Toda vez que encontro uma parede
ela me entrega às suas lesmas.
Não sei se isso é uma repetição de mim ou das
lesmas.
Não sei se isso é uma repetição das paredes ou
de mim.
Estarei incluído nas lesmas ou nas paredes?
Parece que lesma só é uma divulgação de mim.
Penso que dentro de minha casca
não tem um bicho:
Tem um silêncio feroz.
Estico a timidez da minha lesma até gozar na pedra.

-

E depois de fazer tudo o que fazem, se levantam, se banham, se entalcam, se perfumam, se penteiam, se vestem, e assim progressivamente vão voltando a ser o que não são

-

Eu que sou o rei de toda esta incoerência,
Eu próprio turbilhão, anseio por fixá-la
E giro até partir… Mas tudo me resvala
Em bruma e sonolência,

Se acaso em minhas mãos fica um pedaço de ouro,
Volve-se logo falso… ao longe o arremesso…
Eu morro de desdém em frente dum tesouro,
Morro à míngua, de excesso.

Alteio-me na côr à força de quebranto,
Estendo os braços de alma — e nem um espasmo venço!…
Peneiro-me na sombra — em nada me condenso…
Agonias de luz eu vibro ainda entanto.

Não me pude vencer, mas posso-me esmagar,
— Vencer às vezes é o mesmo que tombar —
E como inda sou luz, num grande retrocesso,
Em raivas ideais ascendo até ao fim:
Olho do alto o gêlo, ao gêlo me arremesso…

* * *

Tombei…

E fico só esmagado sobre mim!…

-

" Se todas as tuas noites fossem minhas
Eu te daria, a cada dia
Uma pequena caixa de palavras
Coisa que me foi dada, sigilosa

E com a dádiva nas mãos tu poderias
Compor incendiado a tua canção
E fazer de mim mesma, melodia.

Se todos os teus dias fossem meus
Eu te daria, a cada noite
O meu tempo lunar, transfigurado e rubro
E agudo se faria o gozo teu."
(Hilda Hilst)

-

Não espere de mim nada mais que a paixão
Não espere nada de mais do meu coração
Que bate, rebate e grita
Geme, chora e se agita
Sambando nas cordas bambas de uma viola vadia
Não espere encontrar numa canção
Nada além de um sonho, nada além de uma ilusão
Talvez, quem sabe, a verdade
A infinita vontade de arrancar
De dentro da noite a barra clara do dia

-

Nao te acovardes diante de tuas ações! Não as repudies depois de consumadas! - O remorso da consciência é indecente...

23 mai 2009

8 mai 2009

Germaine Krull

Charles Clifford




François Boucher

Andre Kertesz





6 mai 2009